Saboroso Cadáver - da tradução em inglês, "Tender is the Flesh" - foi uma leitura desafiadora e tenebrosa. Lançado aqui pela Editora Darkside, que cedeu este exemplar em cortesia, esse horror distópico foi escrito por uma autora argentina. E fala sobre um futuro onde o consumo de carne humana passou a ser permitido por lei.
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Na história, acompanhamos Marcos, cuja carreira segue o ramo do abate de humanos. Neste futuro, um vírus cobriu todos os animais do mundo e tornou suas carnes mortais para a humanidade; a partir daí, os governos resolveram liberar o consumo de carne humana de maneira "organizada", e se construiu um mundo onde imigrantes, moradores de ruas, classes sociais mais baixas e outros subjugados pela sociedade passaram a ser tratados como pedaços de carne. Não mais humanos, meros produtos para que a vida possa prosseguir a partir deles.
Deixo aqui o aviso de conteúdo de que Saboroso Cadáver é um livro perturbador. Ele foi feito para isso. É uma distopia que discute consumo e a presença constante da indústria agro ditando o ritmo do mundo, fazendo um paralelo nesse futuro terrível; ela não é uma história sobre revolução, sobre crescimento, sobre rebeldia. É uma história nua e crua sobre o pior da humanidade.
Tem gatilhos de canibalismo, violência extrema, gore, estupro, menções a pedofilia, crueldade animal e outras temáticas carregadas. Leia apenas se tiver estômago e cabeça para lidar com os temas que ela critica.
O livro de Agustina Bazterrica já começa com um soco na cara, que é justamente para ditar o peso da trama. Marcos vai até o abatedouro, e sua visão nos apresenta o local onde trabalha, onde as peças de carne - porque jamais são tratados ou chamados de humanos, para evitar a humanização e, consequentemente, o peso da culpa - são tratadas. Desde o abate até a distribuição. O trabalho de Marcos é lidar com diferentes tipos de problemas naquele ramo, e ele é bom no que faz.
Marcos é um protagonista vazio. Diferente daquele que acompanhamos em 1984, de George Orwell, não é possível torcer por Marcos; não tem humanidade dele, assim como não há humanidade no resto do mundo.
O que eles se tornaram a partir do momento em que os governos tornaram legal o canibalismo é uma sombra de crueldade disfarçada de sobrevivência.
Marcos está sozinho em casa, desde que a esposa se mudou, perturbada pelo luto com a morte do filho pequeno. Distante de tudo e de todos, com apenas a sua mente o acompanhando, é possível sentir que muito do que Marcos era já se foi.
Ou, vai ver, ele sempre foi assim. Parte da sombra que é esse novo mundo. No começo, não tão abertamente cruel quanto outros personagens, como donos de indústrias que veem o lucro acima de qualquer coisa, como caçadores que finalmente podem aproveitar seu sadismo de acordo com a lei.
Mas é um personagem vazio de reação. Tão desprezível quanto o mundo ao seu redor por isso.
Quando ele recebe o "presente", uma humana que foi criada para abate, para fazer com ela o que quiser, ele entra em conflito. Um conflito perturbado, abusivo, nojento. Não dá para lê-lo com empatia; não dá para sentir por Marcos nada além do horror que sentimos pelo resto do mundo.
Saboroso Cadáver - "Tender is the Flesh", da tradução em inglês - é sim uma história perturbadora, mas é também uma história que te coloca para pensar. E muito. Os paralelos dessa sociedade canibal com a nossa, com o consumo desenfreado de carne, é assombrosamente verdadeiro; é impossível não substituir as pessoas nas fábricas de carne por bichos sentenciados ao mesmo tipo de des-vida (porque não dá para chamar criação para abate de qualquer coisa além disso).
É desumano, e é ainda mais macabra a maneira com que eles tratam essa situação. Como eu disse, os governos clamam que é pura sobrevivência, mas será mesmo? Com os ricos caçando humanos por esporte? Com as carnes sendo produzidas a partir de imigrantes, classes mais baixas, pessoas criadas desde a infância para servir a mesa da família com mais dinheiro para pagar por ela?
Não seria mais fácil substituir a carne por outros alimentos, como qualquer pessoa vegana e vegetariana faz? Por que a indústria agro não parou, por que os governos permitiram que tamanho massacre fosse normalizado?
São questões que permeiam a história e a nossa cabeça conforme a trama se desenvolve, e ficam com a gente com o fim. E que fim. Se você espera revoluções ou uma pontinha de esperança, esse não é o livro; como eu disse, ninguém aqui é decente. Os poucos que são, desapareceram do radar por isso. Esse é um mundo que achou tudo bem, em prol da "sobrevivência", comer outras pessoas. Esse é um mundo perverso.
Saboroso Cadáver tem capítulos são curtos, então não enrosca em momento algum. E é simplesmente impossível parar de ler, porque você quer entender, quer saber o que vai acontecer. Quando chega ao fim, fica com uma sensação pesada no estômago.
A edição da Darkside ficou linda. Macabra, como o próprio selo diz. Gostei demais da folha de guarda, dos detalhes da diagramação, e da adaptação da capa. Ficou tenebrosa, como a história de Saboroso Cadáver pede. A tradução é de Ayelén Medail, e achei excelente.
Porque o mundo de Saboroso Cadáver não é um que pode ser salvo ou resgatado. Eles já atingiram o fundo do poço, e dali só podem cavar mais para baixo.
Sinopse: Trabalhando em uma fábrica de processamento local, Marcos faz parte da indústria de abate de humanos - ainda que ninguém mais os chame assim. Sua mulher o deixou, seu pai está afundando em demência, e Marcos tenta não pensar no que faz para ganhar a vida. Afinal, aconteceu tão rápido. Primeiro, houve notícias de que animais estavam infectados com um vírus e sua carne tinha se tornado venenosa. Depois, os governos iniciaram a Transição. Agora, carne humana - "carne especial" - é permitida por lei. Marcos tenta se prender a números, consignados, processamento. Até que, um dia, ele recebe um presente: uma espécime de alta qualidade. Ele a deixa no celeiro, amarrada, um problema para resolver depois. Mas ela o assombra. Seu corpo trêmulo, seus olhos atentos e astutos. Ainda que ele saiba que qualquer contato seja proibido sob pena de morte, pouco a pouco ele começa a tratá-la como um ser humano. E, logo, passa a ser torturado pelo que foi perdido - e pelo que ainda pode ser salvo.
Título original: Cadáver Exquisito
Autora: Agustina Bazterrica
Editora: Darkside
Tradução: Ayelén Medail
Gênero: Distopia | Horror (+18)
Nota: 5
Amiga, desde que eu vi teu stories lendo eu já quero. Não sabia que tinha no unlimited mas vou já pegar emprestado lá.
ResponderExcluirBeijos
Balaio de Babados
Olá, Denise.
ResponderExcluirEu não vou ler porque não tenho estômago pra isso. Já foi dificil ler Jantar Secreto e aquele livro lá que esqueci o nome que eles sofrem um acidente aéreo e comem a carne dos mortos para sobreviver. Eu ia morrer certeza porque não ia conseguir comer não.
Prefácio
Dever ser um bom livro para virar um filme epico
ResponderExcluirCom toda certeza daria um belo filme,mas acho arriscado se não cair nas mãos de uma boa plataforma de streaming para produzi-lo!
Excluirterminei de ler este livro agora, e estou chocada... revira o estômago total, imaginei muitos finais mas não este, surpreende muito. É um livro viciante, apesar de muito forte, não conseguia parar de ler, recomendo muito !!!
ResponderExcluirO final é surpreendente.
ResponderExcluirEspera tudo, menos o que de fato aconteceu.
Eu não li, mas pelo que uma amiga minha contou me lembrou bastante um mangá que li, Yakusoku no Neverland. O início da história está na Netflix em versão anime: The Promised Neverland
ResponderExcluirOi, Anony. Bem superficialmente parecido, mas essa coisa de "criados para abate" não é uma novidade em histórias macabras, né?
ExcluirAcabei de ler. Achei perturbador em mtos pontos. Porém eu esperava mais.
ResponderExcluirAcabei de ler. Achei perturbador, mas imaginei que fosse ter um outro desfecho. Podia ter continuação. Adoraria ver um filme/série.
ResponderExcluirNa minha opinião o que de fato me deixou instigada foi o final,realmente n entendi o porquê de o Marcos ter matado Jazmín
ResponderExcluirPoxa, voce já contou o desfecho....
Excluiramig o final é bem previsível, quando você analisa a personalidade do Marcos o livro todo (frio, imprevisível, pouco se importando com tudo ao redor dele). Ele aceitou o "presente", usou o "presente" e descartou quando foi conveniente pra ele.
ResponderExcluiragora que voces já contaram o final, perdeu a graça de ler!!!
ExcluirAnony, eu tô respondendo uma pessoa que falou sobre o final. Aí você tá lendo comentário por sua conta e risco, né. A resenha tá ali linda e bonitinha sem nenhuma informação, aqui embaixo eu nãoi controlo e respondo as pessoas de acordo com o que elas comentam, né.
ExcluirRapaz, o livro é simplesmente impactante, te faz pensar muito! O final foi mais impactante ainda! Acho que daria pra fazer uma continuação do livro…
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