A R.F. Kuang fez de novo! Ela pegou meu emocional e jogou num liquidificador com outro livro. Sua nova história tem alguns graus de fantasia, de terror e até mesmo de dark academia. Katábasis prometeu tudo e, pra mim, entregou tudo também.
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Alice Law e Peter Murdoch se odeiam. Eles são alunos do professor Grimes, um renomado estudioso da magia em Cambridge. Exigente, ele faz da vida dos alunos um inferno, mas também é aquele que abre todas as portas pós-formação. O problema é que ele morreu num terrível acidente na faculdade e, agora, seus orientados estão sem rumo.
Por isso, Alice decide ir até o Inferno para buscar o professor. Precisa da assinatura dele na sua carta de orientação, ou todo o seu esforço e seus sacrifícios terão sido em vão. Ela só não contava com Peter decidir ir junto.
O problema é que, quando chegam de fato ao Inferno, com o tempo contado para atravessarem os círculos e voltarem para casa com a alma do professor, tudo começa a dar errado.
Eu vou começar essa resenha desmistificando muitas lendas urbanas que cresceram ao redor desse livro. Não, Katábasis não é uma leitura difícil. Não, Katábasis não é um livro acadêmico. Não, Katábasis não precisa ser lido depois de um estudo detalhado sobre Dante e Aristóteles. É um livro de fantasia como qualquer outro. Simpático, com seu grau de complexidade dentro do novo universo apresentado e, no fim das contas, uma grande aventura.
Eu ouso dizer, inclusive, que Katábasis pode ser lido como uma grande história de amor: aos estudos, ao sentido de estar vivo, à fantasia, aos que nos fazem bem.
R.F. Kuang tece aqui mais uma história interessantíssima sobre a complexidade do ser humano dentro de um cenário fantástico. Através dos paradoxos mágicos e dos tribunais do Inferno, ela nos convida a pensar sobre a efemeridade da vida, dos nossos sonhos e anseios, de desejos e pesadelos. Com personagens quebradiços e errôneos, ela apresenta uma jornada de autodescobrimento e, principalmente, de libertação.
- Schopenhauer argumentava que toda arte é meramente representacional e alegórica, exceto a música, que é a coisa mais próxima da vontade pura. Mas eu vejo nos nossos pentagramas algo semelhante à música.
Os paralelos entre a vida acadêmica e a viagem pelo Inferno é quase cômica de tão ácida e debochada. Katábasis coloca Alice e Peter em situações espelho do que viviam na faculdade, convidando-os (e a gente também) a conversar sobre problemáticas elitistas, sociais e raciais não apenas do ambiente acadêmico, mas também da vida como um todo.
Eu gostei demais de ambos os personagens principais. Ainda que Alice seja a voz da história, Peter também tem uma participação muito ativa justamente por digladiar e por bater de frente, sendo a mente analítica e matemática das complicações. Ambos se vangloriam muito da própria inteligência daquele jeito comedido de estudante que se acha melhor do que todo mundo, mas não quer dar na cara que acha isso; foi até gostosinho ver os dois se ferrando em alguns momentos por causa do ego.
A conclusão é que o Inferno não é tão ruim para quem está nele. Essas almas estão exatamente onde queriam estar.
Os dois são personagens difíceis, mas gostáveis por isso. Com personalidades opostas que, aos poucos, eles entendem serem na verdade bem parecidas, é no Inferno que eles se entendem (individualmente, em conjunto). Seus descobrimentos fazem muito pela história, desdobrando novos caminhos e reviravoltas que são muito bem-vindos ao que parecia uma jornada tão linear.
Outra coisa que Katábasis tira de letra é o universo. Kuang transformou o mundo num cenário em que a magia está inserida no dia-a-dia, mas de um jeito comedido porque ainda demanda estudo e cuidado. Os paradoxos usados para os rituais, os pentagramas, a questão com o giz ser a "varinha" dos praticantes de magia, é tudo tão interessante! Que meus olhos brilhavam sempre que uma nova explicação aparecia!
E ela ainda consegue unir o fantástico ao real, introduzindo ideias matemáticas, físicas e filosóficas do por que esses paradoxos funcionam, por que a magia reage ao pensamento e à intenção, por que acadêmicos se debruçam em livros por tantas horas para decifrar os segredos da mente e da vida.
Qualquer livro, assim como o vinho, exalava um aroma de leitura que amadurecia com o tempo, e era por isso que livrarias e bibliotecas tinham um cheiro tão bom.
Katábasis tem um dos sistemas de magia mais simples e igualmente complexos que já li, e eu não consigo expressar em palavras o quanto ele me conquistou. Ver os paradoxos em ação, também, era muito instigante; e os embates entre a mente de Peter e de Alice também rendeu ótimos momentos.
Eu tinha comentado que Katábasis, pra mim, foi uma grande história de amor, e eu volto a repetir que sim. Tal qual o mito de Orfeu atravessando o Inferno atrás de Eurídice, a jornada de dois estudantes fazendo de tudo por seu amor e dedicação a uma vida de estudos também impacta. Mas, mais do que isso, o que realmente mexeu comigo foi vê-los entendendo que talvez seus ideais não estivessem seguindo o norte certo. Talvez houvesse sim o que questionar.
Tem um que de tragédia e um que de cômico no fato de o Inferno ser um campus universitário e isso se prolonga por todo o livro. A participação de outras personagens inseridas nesse contexto enriquece a obra (especialmente Arquimedes e a Elspeth, meus favoritos!) e deixa o que deveria ser uma jornada solitária e mórbida com ares de aventura fantástica.
Nada é melhor do que a felicidade eterna. Um sanduíche de queijo é melhor do que nada. Logo, um sanduíche de queijo é melhor do que a felicidade eterna.
Gostei demais da edição da Intrínseca. Diagramação confortável para ler, revisão impecável e uma ótima tradução de Marina Vargas. Foi a minha primeira vez lendo Kuang em português e foi uma experiência excelente!
Katábasis é uma aventura. Um pouco confusa no começo, emocionante a partir do momento em que tudo se encaixa; com tons de deboche, ela critica; com tons melancólicos, ela faz a gente refletir. Traz questões sobre estar vivo ou estar vivendo ao mesmo tempo em que nos faz rir porque um gato cheio de personalidade resolveu perturbar a vida de dois estudantes no Inferno.
Sinopse: Alice Law tem apenas um objetivo: se tornar uma das mentes mais brilhantes da área de magia analítica. Ela sacrificou tudo: orgulho, vida amorosa e até mesmo a sanidade. Abriu mão do que foi preciso para entrar no programa de pós-graduação de Cambridge e trabalhar ao lado do professor Jacob Grimes, o maior mago do mundo. Mas Grimes não é uma figura fácil. Rígido e exigente, é capaz de ultrapassar qualquer limite. E em um universo onde cometer o menor erro pode ser física e moralmente fatal, Alice se vê sem rumo quando o professor morre em um experimento mágico simples. E a culpa talvez seja dela. O renomado professor vai parar no Inferno ― um lugar inclemente, árido e sombrio, composto por tribunais que expõem os pecados e as vicissitudes humanas. E não resta alternativa a não ser buscá-lo. Afinal, o futuro dela agora está nas mãos de um ser espectral. Mas Alice não vai embarcar nessa jornada sozinha: para seu azar, Peter Murdoch, seu principal rival ao estrelato acadêmico, teve a mesma ideia. Com apenas um punhado de giz para traçar pentagramas mágicos e os registros de Dante e Orfeu para guiá-los através do Inferno, Alice e Peter vão se embrenhar pelo submundo para salvar um homem de quem nem sequer gostam. O Inferno, no entanto, não parece ser como a literatura e a filosofia descrevem. E a magia nem sempre é a solução. Há algo que une Alice e Peter e pode transformá-los nos aliados perfeitos… ou então levá-los de vez à destruição.
Título original: Katábasis
Autora: R.F. Kuang
Autora: R.F. Kuang
Editora: Intrínseca
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