Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman - Queria Estar Lendo

Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman

Publicado em 19 de set. de 2022

Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman

Como é que explico a experiência que foi a leitura de Eu que nunca conheci os homens? O romance de Jacqueline Harpman é uma bordoada na cara. Só consigo definir assim. Uma espécie de drama existencial com distopia com suspense que funciona bem do começo ao fim.

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Quarenta mulheres estão presas em uma jaula, num porão isolado. Três guardas fazem ronda, sem interagir com elas. Há uma porta que se abre e se fecha na troca dos turnos, e para a entrega de alimentos. Elas não devem se tocar e nem tentar fugir, ou serão punidas com um chicote. Elas estão presas ali há tanto tempo que não se lembram mais.

Entre as mulheres, há uma garota. Ela cresceu entre as barras da jaula e não se lembra do mundo lá fora. Diferente das mulheres ao seu redor, essa garota não tem nome, e nem uma história. Ela só conhece essa prisão.

Até que, um dia, uma sirene soa. Os guardas deixam a chave na fechadura da jaula, e disparam para fora, abandonando as mulheres ali. Eles desaparecem, e essa é a chance delas. De fugir, de descobrir o que há lá fora, de tentar seguir em frente. E é a garota sem nome quem vai guiá-las nessa jornada.

Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman

Eu que nunca conheci os homens é um livro muito difícil de explicar. É aquele tipo de experiência de leitura que você tem que viver, porque só assim vai entender. A história que Jacqueline Harpman conta aqui é de um impacto emocional inestimável. É uma história sobre recomeços, sobre a humanidade e abandono.

É também uma história sobre conhecimento, medo e a vivência feminina (dentro de um contexto cisgênero, que fique bem claro. Não há conversas sobre mulheres trans, mas há espaço para imaginar que elas possam estar vivendo essa realidade). Não é um livro feminista, mas traz muitas passagens sobre a força das mulheres que estamos acompanhando. Da ânsia por continuar sobrevivendo nesse mundo que as manteve em cárcere por tanto tempo.

"Então percebi que, sozinha e assustada, a fúria era meu único recurso contra o homem."

A jornada dessas quarenta mulheres, narrada pela garota sem nome, arranca seu coração do peito. Desde a perda da liberdade abrupta que elas viveram, até a peregrinação em busca de um propósito. Tudo é muito devastador. Não é uma história sobre esperança, ainda que a mostre no decorrer da trama.

Eu que nunca conheci os homens vai te perturbar. Não é um livro violento ou pesado, mas é emocionalmente exaustivo. Os dramas existenciais são imensos, e fazem um turbilhão com as suas emoções e pensamentos. Quando termina, deixa uma sensação agridoce. Não é um final feliz, mas poderia ser muito pior. É um final irônico, como a própria situação comenta.

Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman

O desenrolar da história acompanha os percalços pelos quais as mulheres passam. A garota está sempre à frente, uma energia curiosa e intensa em comparação à melancolia das outras prisioneiras. Ela, que nunca conheceu o mundo, quer saber mais dele. As outras, que conheceram tanto, não o reconhecem lá fora.

Se você gosta de histórias com muitas explicações e motivos, esse não é um livro para você. Eu que nunca conheci os homens não te dá a mão e te conta timtim por timtim do que aconteceu; é uma história misteriosa e assim ela acontece. O que houve com o mundo, com as pessoas, com a humanidade? Por que essas mulheres estavam aprisionadas? Há teorias em cada canto do livro, e você escolhe no que acreditar.

- E é isso que é extraordinário: nessa nossa vida absurda, eu inventei algo inesperado.

O final é um baque, como eu comentei, mas é o final mais perfeito para a história que foi contada aqui.

Tem muitas reflexões a fazer a respeito do que a história passa. Os sentimentos que Eu que nunca conheci os homens traz no decorrer da leitura são inúmeros. E falar sobre eles, acredito eu, tira um pouco do peso do que é a experiência dessa leitura. Chegar de surpresa nela é muito melhor do que saber tudo; cada momento terrível, esperançoso, querido ou trágico que aparece na trama é importante para ela.

Resenha: Eu que nunca conheci os homens - Jacqueline Harpman

Essa é minha primeira edição da Dublinense e gostei bastante do trabalho gráfico. A revisão que acabou pecando um pouco - tem alguns trechos com conjugações verbais estranhas que não se encaixam no resto da narrativa. Mas não atrapalham nem um pouco a experiência.

E de que importa eu ficar muda num mundo onde não há ninguém com quem conversar?

Eu que nunca conheci os homens foi uma das leituras mais surpreendentes, reflexivas e melancólicas que já fiz. A história de uma garota, em meio a tantas mulheres, que se sente distante de toda a dor delas, mas que compartilha de cada sentimento. A história de uma jornada em busca de alguma coisa que elas nem sabem se ainda está lá.

Sinopse: Quarenta mulheres estão presas em uma jaula coletiva em um porão, sob a vigilância de guardas que permanecem sempre em silêncio. Um dia, misteriosamente, uma sirene soa, os guardas fogem e as grades se abrem. Entre as prisioneiras, está uma menina sem nome que só conhece a vida lá fora através de lembranças que as outras mulheres aceitam compartilhar. É ela que conduz as demais prisioneiras em fuga, apenas para encontrarem um lugar inóspito e desconhecido. Agora, contando apenas umas com as outras, elas terão que reaprender a viver e enfrentar outro desafio: a liberdade absoluta.

Título original: Moi qui n'ai pas connu les hommes
Editora: Dublinense
Autora: Jacqueline Harpman
Tradução: Diego Grando
Gênero: Drama | Ficção
Nota: 5


5 comentários:

  1. Olá Denise, gostei dessa indicação de leitura! Não é um tipo de livro que estou habituada a ler mas parece interessante por todas as emoções e reflexões que você relatou. =*

    https://www.namoradanerd.com.br

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  2. Olá, imagino o baque que essa leitura seja. Gosto de mistério, mas também gosto de explicações, então para dizer se gostaria ou não da história, só mesmo lendo kkk, mas imagino que seria uma experiência que gostaria de ter.

    Bjs

    Imersão Literária

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  3. Esse livro me deixou absurdada das ideias. É estéril, brutal, mas sentimental e sensível ao mesmo tempo. Não dá pra explicar, tem que ler mesmo.

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  4. Confesso q fiquei bastante consternada com o final...Na minha opinião,uma explicação coerente fez muita falta.

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    Respostas
    1. Não é um livro pra ter uma "explicação coerente", ele fica em aberto justamente porque tudo pode ter acontecido. Ou nada. Literalmente todas as personagens não sabem o que está acontecendo ali. E a única que resta no fim é a que menos sabe sobre tudo. É um final extremamente fidedigno ao que estava sendo contado ali.

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