O novo título do autor de A Casa no Mar Cerúleo chegou aqui em cortesia da Morro Branco, e é uma história sobre a morte e o luto e o que há no meio de tudo isso. Além da Porta Sussurrante é um livro lindo que parte o seu coração em milhões de pedacinhos, só para colá-los de volta pouco a pouco.
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Wallace Price só conhece o trabalho. E tá tudo bem pra ele, que é um homem com muito foco e pouco tempo para viver. Ele é rígido, é exigente e é um grande babaca. Só que não sabe disso porque, para ele, trabalho é tudo. Empatia, amizade, família? Ele não pode perder tempo com isso.
Até que, um belo dia, ele morre. E acorda no próprio funeral. Indignado com esse absurdo que só vai atrapalhar seu trabalho, Wallace se recusa a ouvir Mei - sua Ceifadora - e se recusa ainda mais a participar do que quer que seja a situação de travessia que tem que viver em uma casa de chás comandada por um simpático barqueiro chamado Hugo.
Só que Wallace não tem muita escolha, porque está morto. É isso ou se tornar uma criatura vazia, como acontece com os mortos que deixam o lugar de travessia. Ranzinza, ele permanece ali, só para perceber que tem muito a aprender sobre si mesmo em sua morte.
Além da Porta Sussurrante é, sem sombra de dúvidas, um dos melhores livros que já li. Não apenas pela narrativa maravilhosa do T.J. Klune, mas porque é uma história sensível, empática e emocionante. É aquele tipo de livro que termina e fica com você, por todos os personagens, todas as situações, tudo que a trama quis passar.
É um livro sobre luto. Sobre a morte, seu peso, o que significa morrer, o que significa perder alguém. É um livro sobre corações partidos porque estar em luto é ter seu coração partido para sempre.
O luto sempre foi uma questão muito forte e muito difícil pra mim, e imagino que para muitas pessoas. E por isso é tão importante ler uma história que trata disso de maneira tão amorosa.
Além da Porta Sussurrante não romantiza a morte. O livro simplesmente fala dela, de todas as maneiras possíveis. Fala sobre como é injusta e justa ao mesmo tempo, sobre como trata todo mundo igualmente, mas também vem fora de hora. Traz muitos diálogos que desenvolvem a questão de "o que é estar morto? O que tem depois disso?" mantendo o enigma. Afinal, quem sabe?
- Mas a morte não discrimina. Ela vem para todos.
Eu me emocionei demais com tudo que o autor apresentou no decorrer da história. T.J. Klune segura nossa mão, como leitores, e nos fala que tudo bem sorrir e chorar e sentir raiva e saudade e tristeza e nostalgia quando pensamos em quem perdemos. Porque é tudo que a morte representa. O fim, mas não o fim realmente.
Além da Porta Sussurrante ainda faz o brilhante trabalho de contar tudo isso através de personagens tão, mas tão queridos.
Wallace começa como um grande babaca insensível. A gente sente raiva dele, para logo em seguida sentir pena, e depois indignação e então compreensão e finalmente empatia. Ele era, sim, uma pessoa horrível em vida. Cruel, injusto, mesquinho, egoísta. Mas também solitário. E, quando ele começa a perceber quem era, o que perdeu por ser assim, bate aquele sentimento de remorso que a trama desenvolve tão bem junto com o seu desenvolvimento.
O Wallace do começo é outro personagem no fim, e por isso sabemos que ele fez um progresso como morto. Pode não ter sido ótimo em vida, mas tem seu crescimento como protagonista. O que faz com que a gente o ame absurdamente.
- Todo mundo está um pouco triste o tempo todo.
Além dele, a casa de chás é também composta por Hugo (o barqueiro, responsável por acolher e guiar os mortos até a porta que leva além), Mei (a Ceifadora, que encontra os mortos e os leva para o lugar de travessia), Nelson (o avô morto de Hugo) e Apollo (o cachorro morto de Hugo).
Sabe aquela sensação gostosa de found family, quando a gente vê uma família improvável se formando entre pessoas ainda mais improváveis? É o que acontece quando Wallace se permite "viver" esse pós-vida na casa de chás, enquanto espera seu momento de seguir em frente.
Hugo é um amor, em todos os sentidos da palavra. Um personagem cheio de altruísmo e empatia, que encontrou no trabalho como barqueiro a sua vocação. Ele entende as pessoas, e sabe como falar - mas, acima de tudo, ouvir.
Eu me apaixonei por ele no instante em que ele interagiu com o Wallace. E ver o relacionamento dos dois se desenvolver nesse companheirismo e amizade e finalmente algo a mais - algo frágil, doloroso porque, afinal, Wallace está morto - é de partir o coração e aquecê-lo ao mesmo tempo.
Mei é uma força da natureza. Eu amo todas as interações dela com a galera porque ela é enérgica, cheia de atitude, e também tem um coração de ouro para lidar com todas as situações. Onde Hugo é a emoção, Mei é a emoção explosiva.
- Se querer fosse sempre poder, não haveria ser ou não ser.
E aí temos Nelson e Apollo, que foram os meus favoritos. O vovô sarcástico e piadista, e o cãozinho para todos os momentos. O quanto eu chorei e sorri e gargalhei e amei esses dois não tá escrito, porque eles realmente... existem, ali. Estão mortos, mas vivem como nenhum outro consegue. E o jeito com que o Nelson ama seu neto é tão querido, tão importante, que eu só queria poder dar um abraço nos dois.
Eu queria poder abraçar todos os personagens de Além da Porta Sussurrante, essa é a verdade. Menos o Alan. Mas deixo para vocês entenderem sobre ele na leitura.
Todas as interações entre os personagens são muito reais. Desde as mais engraçadas até as mais emocionantes, que tocam em sentimentos que machucam, que perturbam; quando falam a verdade sobre as coisas mais dolorosas da vida (e da morte).
Tem um romancinho, como eu mencionei, mas ele é sutil e de um slow burn intenso. Porque Hugo e Wallace são impossíveis, mas isso nunca impediu o amor de prosperar, não é? Aliás, pra quem busca representatividade, Wallace é bissexual e Hugo é gay!
E é maravilhosamente bem escrito porque eles só.. Existem. Não tem conflito, não tem drama, não tem absurdos. É sobre um homem bissexual (relativamente) bem resolvido emocionalmente, e um homem gay extremamente bem resolvido emocionalmente com a sua sexualidade. E é lindo.
Toda a mitologia que o autor criou em cima desse lugar de passagem, as questões com os chás que o Hugo faz e o que eles representam para quem está vivo e quem está morto, o que está além da porta sussurrante, é tudo muito criativo e bem explicado quando precisa, mantendo o mistério onde cabe.
- Nunca é suficiente, é? O tempo. Sempre achamos que temos muito dele, mas, quando realmente nos damos conta, não temos o suficiente.
Eu perdi um dos meus melhores amigos dois anos atrás. No dia em que eu tô escrevendo essa resenha, aliás, fez dois anos que ele se foi. E é injusto, e é terrível, e eu sinto raiva e saudade e vontade de chorar e gritar. Mas as vezes sinto vontade de rir e sorrir e falar sobre ele como se ainda estivesse aqui. E acho que o que mais me pegou nesse livro foi como ele falou comigo sobre isso. Como ele segurou a minha mão e me disse que tudo bem... sentir.
E às vezes vai ser péssimo, e às vezes você vai se sentir melhor, e às vezes a dor vai sufocar. Porque a morte é isso. O fim de um tudo, e o que ainda continua aqui.
A edição da Morro Branco tá naquele primor de sempre. Eu amo amo amo essa capa (uma das minhas novas favoritas da estante, inclusive), e a diagramação tá uma lindeza, confortável e bem espaçada, com detalhes lindos nas folhas de guarda e dentro das páginas. A tradução de Petê Rissati também tá ótima, com trocadilhos maravilhosos e linguagem não-binária muito bem-vinda!
Além da Porta Sussurrante é um livro lindo. E eu digo e repito que todo mundo precisa ler. Não apenas por falar sobre a morte de maneira tão nua e sensível, mas por falar sobre amor da maneira mais intensa possível.
Sinopse: Bem-vindos à Travessia de Caronte. O chá está quente, os cookies estão frescos, e os mortos estão apenas de passagem. Wallace Price só conhece três coisas na vida: trabalho, um pouco mais de trabalho e algumas pitadas de trabalho. Assim, é extremamente inconveniente quando ele tem de parar tudo e atender ao seu próprio funeral. Mas quando ele recebe a visita de Mei, uma Ceifadora, ele começa a ter uma leve desconfiança de que possa estar morto. Em vez de levá-lo diretamente ao além, ela o guia a uma pequena vila em cujos arredores, escondida entre as montanhas, fica uma peculiar casa de chá. E quando Hugo, seu carismático proprietário e barqueiro do além-vida, se oferece para ajudá-lo a fazer a travessia, ele decide que efetivamente deve estar morto. Mas Wallace não está pronto para abandonar a vida que mal viveu e recebe uma última chance. Sete dias. Uma semana para viver uma vida inteira e talvez, enfim, apaixonar-se pelo que ela pode proporcionar. Às vezes, a morte é só o começo… Hilário, comovente e acolhedor, Além da porta sussurrante é uma história inspiradora sobre viver dentro de um escritório e passar a morte construindo um lar.
Título original: Under the Whispering Door
Autor: T.J. Klune
Editora: Morro Branco
Tradução: Petê Rissati
Gênero: Fantasia
Nota: 5+
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